quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

São Lourenço proíbe rap e funk no Carnaval

Decisão da Prefeitura foi tomada em conjunto com representantes da Segurança
por Jéssica Balbino

“Que tempo bom, que não volta nunca mais (...)”, esse pequeno refrão é parte de uma música do Thaíde e DJ Hum. Para quem não sabe, a dupla ficou famosa nos anos 80 por lançarem o Rap – ritmo e poesia – no Brasil. Saudade do tempo em que a ditadura ia por água abaixo, junto com a censura e era possível cantar os protestos e pregar a paz, o amor, a união e a diversão, incentivadas por Afrika Bambaataa, pai da cultura hip hop.Entretanto, não é de hoje que a cultura feita nas ruas vem sendo depreciada e barrada em eventos, como aconteceu na Virada Cultural em 2008 quando o palco do “Baile Chique” foi colocado a quilômetros de distância das demais atividades e policiais, com a agressividade costumeira, revistavam os adeptos da cultura, tratando-os como bandidos. A novidade fica por conta da decisão tomada pela prefeitura de São Lourenço, que proibiu, através de um decreto o rap e o funk no Carnaval. Se eu quiser estar na cidade e dançar ao som de James Brown ou do rei do pop Michael Jackson não vou poder?! Ah ...porque eles fazem funk. Quer dizer que eu, como jornalista e muitos de nós, escritores da nova geração contemporânea e referência nacional somos pessoas que incitamos a violência o desrespeito à autoridade?Será mesmo? Porque sou adepta do hip hop e por conseguinte do rap ! Adoro o ritmo e as letras nacionais. De Racionais MC´s ao novo Emicida, passando por raps regionais como o do grupo UClanos e do Elemento.S da capital mineira. Voltamos ao tempo da ditadura, da censura. Proibir determinado estilo porque querem resgatar o axé e as marcinhas?Não estou dizendo que uma música é melhor do que a outra, mas o decreto (absurdo) dita regras para a festa popular. Se é popular é feita pelo povo. Isso está claro e não deve ter restrições quanto ao estilo musical ou manifestação cultural. Sim, porque o funk, seja o antigo ou o carioca, gostem ou não, são manifestações culturais. Crime ou cultura? O som dá medo...e prazer ! E isso está presente em teses de doutores, em livros de escritores urbanos e contemporâneos e sendo ensinado nas escolas, quer queiram, quer não. Além da execução pública do rap e do funk pelos grupos que participam do Carnaval o decreto proíbe os estilos até mesmo em carros particulares que circulem pela área onde ocorre o Carnaval.Aaaah, dá licença. Não vou a São Lourenço, mas se vivesse na cidade, escutaria o que quisesse no carro, seja onde fosse. O carro é meu, o som também. O gosto então, nem entro nesse mérito. Qualquer pessoa tem o direito de ir e vir. Mais ainda de ouvir o que quiser onde quiser. Faça-me o favor. É Carnaval. É festa popular. É manifestação. Aliás, a maior do país. Como assim eu não posso ouvir e dançar ao som do rap e do funk?! A notícia diz mais, que a decisão foi tomada pela Prefeitura em conjunto com o juiz do Juizado Especial, Ronaldo Ribas (parabéns, magistrado), representantes da Polícia Militar e do setor de turismo da cidade. Segundo a notícia, a proibição tenta preservar uma festa baseada em seus ritmos originais. Não por nada, mas o funk já se tornou um ritmo original no Brasil. O rap, a mesma coisa. Por que proibir? Por que incomoda tanto?Uma cidadezinha do interior mineiro pode calar alguns gatos pingados que vão para a estância curtir o Carnaval, mas não consegue calar o grito de protesto que emana dos becos, guetos e vielas de todo país, seja por meio da oralidade do rap, das batidas do funk ou da literatura marginal, que se utiliza destas e de outras armas, dadas por esta mesma comissão de segurança carnavalesca, para guerrear contra a humilhação, a repressão e a censura. Conseguem calar, mesmo que brevemente, algumas pessoas em seus carros e em seus blocos de Carnaval, mas não vão parar a nossa mídia, o jornalismo e tampouco a literatura. Pensaram que não sabíamos ler e estamos escrevendo livros. Tomem conhecimento disso, elite. Escrevemos sobre rap, escrevemos sobre funk, nossa cultura o hip hop. Somos marginalizados mas não nos tornamos marginais. Temos sim, direito de trabalhar e exercer nossas profissões e ainda mais, de termos o que os outros estilos musicais têm. Temos o DIREITO de cantar a nossa música. No mais, acho que todos queremos é a Paz.

Jéssica Balbino – mineira, 24 anos, moradora da periferia de Poços de Caldas, jornalista formada, autora do livro Hip Hop – A Cultura Marginal, integrante do livro Suburbano Convicto – Pelas periferias do Brasil, colunista do site Ciranda Internacional de Informação Independente, e do Literatura Periférica defendendo as causas da cultura hip hop. (leia-se rap e funk neste contexto)Voluntária de trabalhos com hip hop na periferia, atualmente atuando como repórter no Jornal Mantiqueira, idealizadora da série de reportagens Ás Margens da Sociedade, com pessoas de muito conteúdo e excluídas do restante da população.
Mantém o blog Cultura Marginal: www.jessicabalbino.blogspot.com

jessica@mantiqueira.inf.br

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